A natureza sempre encontra um jeito de sobreviver. E não é de hoje que nos surpreendemos com a capacidade de transformação e adaptação das mais variadas espécies animais e vegetais no meio ambiente. Do camaleão que muda completamente a cor da pele de acordo com o ambiente, ao peixe que possui bioluminescência para viver em profundidades onde a luz natural não chega, o fato é que o processo de evolução é fascinante e constantemente mutável.
Desta vez, a novidade vem do Brasil… Pesquisadores descobriram um fungo cultivado nas colmeias pelas próprias abelhas (da espécie Mandaguari Scaptrotrigona Depilis – Abelhas sem ferrão), e que tem como função a alimentação das larvas. Descoberta foi publicada na Current Biology, uma das mais importantes revistas de biologia em todo o mundo.
A importância da descoberta está no fato de que este é o primeiro registro de simbiose entre uma espécie de abelha social (que vive em grupos) e este determinado tipo de fungo. Além disso, nunca antes um cultivo de fungo por abelhas havia sido registrado, somente em algumas espécies de formigas.
“As larvas das abelhas comem o fungo e sem ele não se desenvolvem. Isso tem uma importância prática grande, porque muitos fungicidas e bactericidas que não afetam as abelhas diretamente podem causar efeitos graves se afetarem os microrganismos das colônias”, afirma Cristiano Menezes, pesquisador responsável pela descoberta da Embrapa Amazônia Oriental (PA).
O fungo
Do gênero Monascus, o fungo filamentoso tem origem no material que as abelhas utilizam para construir as células de cria, onde as larvas se desenvolvem logo após a rainha botar os ovos. Outro ponto interessante do fungo é que as abelhas o utilizam com o mesmo objetivo que os asiáticos para conservação de alimentos. “Estudar essa simbiose pode revelar novas substâncias aplicáveis à saúde humana e a das abelhas”, concluiu Menezes.
Descoberta
Para chegar à descoberta do fungo que garante a sobrevivência das abelhas, Menezes primeiro estava tentando criar no laboratório algumas abelhas sem ferrão. O estudo iniciado há oito anos na Universidade de São Paulo (USP) em Ribeirão Preto, se desenvolveu na Embrapa, principalmente após maior aprofundamento na pesquisa entre o fungo e as abelhas.
“Levei mais de um ano combatendo o fungo como se fosse uma doença que atacava as abelhas. Tentava exterminá-lo, mas em vão. Resolvi experimentar criar as larvas em ambiente menos úmido, pois percebi que havia fungo nas células de cria naturais. Consegui com isso mais de 90% de sobrevivências na criação em laboratório. Foi quando pensei que a larva pudesse estar se alimentando do fungo”, argumenta Menezes.
Além da descoberta principal, o pesquisador também busca entender a influência deste fungo em outras espécies de abelhas. “Já encontrei fungos similares em outras espécies de abelhas sem ferrão do mesmo gênero e de outros gêneros distintos”, complementa o pesquisador, que acha provável a existência de diferentes sistemas de cultivo de micro-organismos.
“Devemos proteger e estudar mais as abelhas, que atraem a atenção de pesquisadores, produtores e outras pessoas devido ao grande potencial de polinização das culturas agrícolas e seus produtos, como mel e própolis”, finaliza Cristiano Menezes, a respeito dos próximos passos que deverão englobar testes sobre a influência de fungicidas em culturas agrícolas neste tipo de fungo que garante a sobrevivência das abelhas.