A água, fonte de vida do planeta, está ameaçada por agrotóxicos.
A constatação é alarmante: um coquetel que mistura diferentes agrotóxicos foi encontrado na água de 1 em cada 4 cidades do Brasil entre 2014 e 2017, o que equivale a 25% do território brasileiro.
Os dados são do Ministério da Saúde e integram investigação conjunta da Repórter Brasil, Agência Pública e a organização suíça Public Eye. As informações são parte do Sisagua (Sistema de Informação de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano), que reúne os resultados de testes feitos pelas empresas de abastecimento.
No período analisado, as empresas de abastecimento de 1.396 municípios detectaram todos os 27 pesticidas que são obrigados por lei a testar. Desses, 16 são classificados pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) como extremamente ou altamente tóxicos e 11 estão associados ao desenvolvimento de doenças crônicas como câncer, malformação fetal, disfunções hormonais e reprodutivas. Especialistas pontuam que as pessoas que já estão desenvolvendo doenças em decorrência dessa múltipla contaminação provavelmente nunca saberão a origem da sua enfermidade; nem os médicos.
Entre os locais com contaminação múltipla estão as capitais São Paulo, Rio de Janeiro, Fortaleza, Manaus, Curitiba, Porto Alegre, Campo Grande, Cuiabá, Florianópolis e Palmas.
Situação desenfreada
Os números revelam que a contaminação da água está aumentando desenfreadamente. Em 2014, 75% dos testes detectaram agrotóxicos, subindo para 84% em 2015. Em 2016, a marca atingiu 88%, alcançando 92% em 2017. Se a situação continuar nesse ritmo, será difícil encontrar água sem agrotóxico nas torneiras de todo o Brasil.
Entre os agrotóxicos encontrados em mais de 80% dos testes, há cinco classificados como “prováveis cancerígenos” pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos e seis apontados pela União Europeia como causadores de disfunções endócrinas, o que gera diversos problemas à saúde, como a puberdade precoce. Do total de 27 pesticidas na água dos brasileiros, 21 estão proibidos na União Europeia devido aos riscos que oferecem à saúde e ao meio ambiente.
A falta de monitoramento também é um problema grave. Dos 5.570 municípios brasileiros, 2.931 não realizaram testes na sua água entre 2014 e 2017. Ou seja, o cenário pode ser ainda mais crítico.
Coquetel de agrotóxicos
A mistura de variados agentes químicos, constatada no estudo, preocupa especialistas. Mesmo que um agrotóxico não tenha efeito sobre a saúde humana, ele pode ter quando misturado à outra substância.
No estado de São Paulo foi onde mais a população bebeu esse “coquetel tóxico”. O território paulista foi recordista em número de municípios onde todos os 27 agrotóxicos estavam na água. São mais de 500 cidades, incluindo a Grande São Paulo – Guarulhos, São Bernardo do Campo, Santo André e Osasco – além da própria capital. E algumas das mais populosas, como Campinas, São José dos Campos, Ribeirão Preto e Sorocaba. O Paraná foi o segundo colocado, com coquetel presente em 326 cidades, seguido por Santa Catarina e Tocantins.
Em âmbito nacional, até a água mineral corre riscos, já que, de acordo com especialistas, embora ela venha de outras fontes, essas são alimentadas pela água que corre na superfície, logo, eventualmente também serão contaminadas.
O que fazer?
Para mudar essa realidade, é primordial que seja feito um trabalho preventivo para evitar que os agrotóxicos cheguem aos mananciais. Uma vez a água contaminada, são poucos os tratamentos disponíveis para tirar o agrotóxico da água, pois alguns filtros são capazes de tirar alguns tipos de agentes químicos, mas não há um que dê conta de todos.
Especialistas também defendem a proibição do uso dos pesticidas que oferecem maior risco, assim como já ocorre em outros países.