Acabar com a seca do nordeste é mais do que um sonho, é um projeto. A maior infraestrutura hídrica que o Brasil jamais viu antes. Estamos falando da transposição do rio São Francisco, obra de infraestrutura do Governo Federal que tem o objetivo de levar água para 12 milhões de pessoas de 390 municípios do Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. Entretanto, desde que entrou em cena, o projeto tem gerado muita polêmica, sobretudo no que se refere à questão sociocultural indígena e quilombola, que precisarão ser realocados.
A transposição do rio São Francisco será dividida em dois eixos:
Eixo Norte – com 400 km de extensão, levará água para os sertões de Pernambuco, Paraíba, Ceará e Rio Grande do Norte, alimentando quatro rios, três sub-bacias do São Francisco (Brígida, Terra Nova e Pajeú) e mais dois açudes: Entre Montes e Chapéu. O ponto de captação de águas será próximo à cidade de Cabrobó (PE).
Eixo Leste – percorrerá uma distância de aproximadamente 220 km, partindo da Barragem de Itaparica (PE) até alcançar o Rio Paraíba (PB), abastecendo o agreste desses dois estados.
Com uma extensão de 2.800 km, o São Francisco é a bacia hidrográfica mais importante do nordeste brasileiro. Ao longo de décadas, já sofreu intervenções que prejudicam o seu equilíbrio natural e que são responsáveis pelo desmatamento de cerca de 96% de suas matas ciliares (localizadas nas margens do rio) e pela remoção de mais de 150 mil pessoas para a construção de hidrelétricas e barragens.
Para a transposição do “Velho Chico” – como é chamado carinhosamente – se concretizar, muitas famílias rurais e aproximadamente de 33 tribos indígenas, sobretudo das etnias Truká e Pipipã precisarão deixar suas terras. Estima-se que cerca de 8 mil índios serão impactados diretamente. Além disso, há outros 44 impactos negativos listados pelo Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), dentre eles:
• Modificação da composição das comunidades biológicas aquáticas nativas das bacias receptoras;
• Tensões e riscos sociais durante a fase de obras;
• Ruptura de relações sociocomunitárias durante a fase de obras;
• Pressão sobre a infraestrutura urbana;
• Risco de interferência com o patrimônio cultural;
• Perda e fragmentação de cerca de 430 hectares de áreas com vegetação nativa e de habitats de fauna terrestre;
• Risco da introdução de espécies de peixes potencialmente daninhas ao homem nas bacias receptoras;
• Interferência sobre a pesca nos açudes receptores;
• Modificação do regime fluvial das drenagens receptoras.
Alguns desses tópicos já estão sendo constatados e, ainda segundo o relatório, há risco de redução de biodiversidade e perda de aproximadamente 4 mil hectares de terras com potencial para a agricultura. Mais do que resolver a questão da seca no nordeste, a transposição do rio São Francisco gera dúvidas, riscos e perdas irreversíveis ao ecossistema e às comunidades tradicionais.