Os oceanos estão em perigo. Se não bastasse a contaminação dos plásticos e os frequentes derramamentos de petróleo, estudos recentes têm demonstrado que a poluição sonora é um problema gravíssimo que ameaça os oceanos com a destruição de ecossistemas e da biodiversidade. É um tipo de poluição invisível, menos documentada e que causa menos alarme, porém seus efeitos podem ser catastróficos.
No mês de janeiro deste ano, o pesquisador Michel André, do Laboratório de Aplicações Bioacústicas da Universidade Politécnica da Catalunha, estuda há vários anos o impacto sonoro humano nos mares e destacou que suas pesquisas demonstram que praticamente não há lugares nos oceanos sem contaminação acústica, o que se explica pelo aumento da atividade humana nos mares e porque as propriedades de propagação do som na água fazem com que viaje a uma velocidade cinco vezes maior do que o faria no ar.
São diversas as atividades humanas causadoras da poluição sonora submarina. A de maior impacto é a realização de sondagem acústica para realizar prospecção de petróleo e gás no subsolo marinho. O tráfego marítimo é outra causa importante, principalmente porque mais de 90% do transporte mundial de mercadorias é realizado por meio de navios. Entre outras atividades ainda podem ser mencionadas a utilização de sonares militares e de explosivos no mar e a construção de infraestruturas no leito marinho.
O tráfego de navios ocorre durante 24 horas – se calcula que diariamente há 60.000 navios de carga navegando simultaneamente – e o movimento das hélices gera turbulências e bolhas com ruídos similares às explosões. Por outro lado, há cada vez mais exploração de petróleo nos oceanos com a utilização de bombas que, ao detonarem, provocam grandes ondas sonoras que se espalham por milhares de quilômetros sem perder a intensidade.
O nível de ruído antropogênico no meio marinho aumenta a um ritmo alarmante. É cada vez maior a preocupação com a proliferação desses sons, pois representa uma ameaça significativa para os ecossistemas marinhos e para a sobrevivência das populações de mamíferos, tartarugas, peixes e outros animais dos oceanos.
Este tipo de contaminação coloca em risco particularmente os cetáceos – entre eles os golfinhos e as baleias – devido à sua fisiologia específica que depende de um sofisticado sistema de localização acústica para sua orientação, alimentação e reprodução. Suspeita-se que os frequentes encalhes desses mamíferos sejam causados por desorientação de origem acústica. Em relação aos invertebrados marinhos, que não possuem ouvidos, seus órgãos sensoriais é que lhes permitem manter seu equilíbrio na água e estes também sofrem “traumas acústicos” que os desequilibram de forma irreversível.
Os estudos têm demonstrado que a baleia franca do norte, que corre risco de extinção, tem tido a sua reprodução prejudicada pela contaminação acústica que é maior nos mares do norte devido à alta intensidade do tráfego de navios e da exploração do petróleo. Por outro lado, a baleia franca do sul tem sido menos prejudicada, tendo sua população aumentada, pois nos mares do sul há menor atividade humana em comparação com o hemisfério norte. Mesmo assim, a situação das baleias francas do sul inspiram cuidados. Seus locais de reprodução nas costas brasileiras correm riscos devido ao aumento da exploração do petróleo e à realização de obras e atividades que envolvem dragagem e uso de explosivos.
O caminho da solução é a mobilização para obter uma maior consciência social acerca do problema e propor soluções. Nesse sentido há um movimento global visando a diminuição da contaminação acústica nos oceanos. Desde 2005 a Organização das Nações Unidas (ONU) classifica esse tipo de poluição como uma das cinco maiores ameaças para os mamíferos marinhos e em função dessa situação estabeleceu a redução e regulação da contaminação acústica do oceano como uma de suas altas prioridades. Com atuação global, existe desde 2002 a Coalizão por Oceanos Silenciosos (Silent Oceans Coalition) uma plataforma internacional formada atualmente por 26 organizações que trabalham conjuntamente para alcançar uma redução dos níveis de ruído submarino de origem antropocêntrica nos mares e oceanos do mundo e sua regulação a nível mundial.